sexta-feira, outubro 7

Perséfone

A mulher de cabelo encaracolado liga o rádio. Para apagar da sua frente a fila interminável de carros. Para deixar de ouvir as vozes dos filhos no banco de trás. Para fingir que ouve as noticias que já conhece. Pousa o cotovelo na janela aberta carro. Uma voz do banco de trás. Mãe. Ignora . A fila de carros preto e cinzentos funde-se no ponto de fuga da estrada. Mãe. Há quem buzine. Ela aumenta o som do rádio. Há uma carrinha pintada de verde vidro com cortinados nas janelas, três carros à frente. Quase-sorri.  Pensava que já ninguém tinha carrinhas dessas. Senta-se no alpendre da casa dos avós. Há uma latada por cima do poço e duas cadeiras de baloiço onde os avós esperam o tempo. As vozes dos primos sobrepõem-se às buzinas. Há planos e vontade. Um verão à deriva. Mãe. O tom de voz monocórdico. Sim? O carro avança uns metros. E aquele cansaço. Havia uma romanzeira. Não comas as bagas dizia-lhe a prima que usara tranças até depois dos vinte. Que ficas presa metade da tua vida ao inverno. Todos nós preferimos o inverno onde somos iguais aos outros. Há risos que se fundem com o choro fininho do banco de trás. Buzinam de novo e ela lembra-se da roupa para passar, das contas, das notícias que a aborrecem. Mãe. A impaciência cresce. Buzina também. A carrinha verde avança. Os carros atrás não. Ficam parados no mesmo sitio. Mãe. Mas o que foi? A voz que choraminga. Não comas as romãs. O cheiro morno do Verão e o cabelo alisado à força pelo ferro de engomar. E o cesto da roupa. As contas. Buzina, e pragueja. Mãe. Perdeu a carrinha verde de vista. Não comas as bagas.


Panna cotta com molho de romã



Ingredientes ( para 4)
200ml natas
250ml de leite
4 folhas de gelatina
75g de açúcar
1 vagem de baunilha

Molho de romã
2 romãs maduras
½ chávena de açúcar
½  chávena de água
½ colher de chá de raspa de lima

Hidrate as folhas de gelatina em água fria. Leve as natas com o leite, o açúcar e as sementes de baunilha (abra a vagem longitudinalmente e raspe as sementes com a ponta de uma faca) ao lume até levantar fervura. Retire do lume e deixe por 20 minutos em infusão. Adicione as folhas de gelatina e deite em ramequins. Leve ao frigorífico até solidificarem.
Leve o açúcar, a água e a raspa de lima ao lume até fazer ponto de pérola. Deixe arrefecer compactamente e junte o sumo das duas romãs. Leve a lume muito brando até ficar com consistência de um xarope leve. Sirva por cima dos panna cotta desenformados.

5 comentários:

mfc disse...

Eo tempo não passa. E os sons sempre iguais. E a fila que não anda. E os recados de sempre...

luisa disse...

Estão a ficar com boa côr as romãs ali da horta. Breve, breve vou experimentar as suas bagas. E vão ficar guardadas aquelas romãs que hão-de esperar até aos Reis para que as bagas que nesse dia comer cumpram a sua função lendária de me evitar as dores de cabeça e de não se me acabar o dinheiro. :)

Luis Eme disse...

sim, Mãe, não comas as bagas.

beijinho Cristina

Isabel J. disse...

Meio dia no mundo real e meio dia no mundo dos sonhos :D

Mt bom, Cris! Once again...

:*

Blondewithaphd disse...

Ai Jesus que até fico zonza!!! Que coisa deliciosa deve ser. E que foto maravilhosa!